Lei de Proteção de Dados foi sancionada em 18 de setembro de 2020; e maior parte das ações movidas se concentra em São Paulo, com 74%
Em 18 de setembro de 2020, foi sancionada a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). De lá para cá, a lei já embasou quase 600 sentenças judiciais que questionam o uso de seus dados por empresas.
Lei de Proteção de Dados – ações
Por conta da Lei de Proteção de Dados, 598 decisões já proferidas em todos os tribunais datam desde setembro de 2020 até 25 de junho deste ano. Os motivos principais tratam diretamente de proteção de dados pessoais e privacidade. De acordo com um levantamento da empresa especializada no uso de ferramentas automatizadas para fazer varredura de tribunais, a Juit.
Das 598 decisões já tomadas em todos os tribunais do país de 18 de setembro de 2020, data de sanção da lei, a 25 de junho deste ano, a metade trata diretamente de proteção de dados pessoais e privacidade, mostra levantamento da Juit, empresa especializada no uso de ferramentas automatizadas para fazer varredura de tribunais, chama a atenção a desconfiança com as informações pessoais em diários oficiais. A pedido da Folha de S. Paulo, a empresa também constatou o receio de documentos de tribunais expostos em buscadores como o Google e Yahoo.
Sendo assim, cidadãos cada vez mais preocupados com sua reputação digital, não querem digitar o nome na internet e encontrar um processo trabalhista de seu passado, seu endereço, ou ainda uma multa, por exemplo.
Ainda não existe regulamentação sobre serviços privados
Por outro lado, ainda não existe regulamentação sobre serviços privados. E é justamente aqui que se enquadram os maiores buscadores da internet. Mas como a LGPD não trata de direito ao esquecimento, neste caso não haveria como remover de plataformas como o Google as informações que desagradam determinado internauta.
Maior parte dos casos se concentra em São Paulo
Do total de decisões judiciais, 74% são de primeiro e grau e estão concentradas em São Paulo. Portanto, isso sinaliza que a questão está longe de contar com uma jurisprudência consolidada. Isso porque uma parte dos processos deverá ser discutida em tribunais superiores.
Tendências
Apesar disso, especialistas do setor identificam algumas tendências. Entre as quais: apreço pela base legal do consentimento, que é uma das leis que determina a autorização expressa do cidadão para a coleta de um dado pessoal. Outro fator trata do entendimento de que um vazamento não necessariamente resultará em indenização por dano moral. Neste caso, é necessário provar a relação entre um smartphone exposto indevidamente na internet e ao assédio de telemarketing, por exemplo.
Esfera trabalhista
Por outro lado, ex-funcionários recorrem à LGPD na intenção de garantir apenas que suas iniciais apareçam em litígios trabalhistas, ou ainda para que todos os seus dados sejam deletados de uma empresa sua demissão.
Mas para o advogado Fabrício Mota, sócio do Serur Advogados, dificilmente se consegue este feito logo de cara.
“A empresa tem que manter esses registros de jornada de trabalho e horas extras por um tempo para se proteger judicialmente.”
Processos automatizados
Em relação à reivindicação de informações sobre processos automatizados (feitos por robôs) de empresas, a lei autoriza o pedido. Um exemplo claro é o de um ex-motorista de aplicativo que quis entender os critérios de seu bloqueio na plataforma. No entanto, o caso ainda não foi concluído.
As sanções da LGPD passam a valer em 1º de agosto. Portanto, há uma expectativa de que cresça o volume de processos nos próximos meses.
Aplicação das multas
Fica a cargo da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão ligado à Casa Civil, a responsabilidade de aplicar as multas. Elas podem ser de até 2% do faturamento da empresa, com limite de R$ 50 milhões por infração.
Transição
Especialistas afirmam que o Brasil está em uma fase de transição para a cultura de proteção de dados, que já é bem madura na Europa.
Segundo Bruno Bioni, do Data Privacy Brasil, o amadurecimento de cidadãos e companhias ainda levará um longo tempo, apesar do movimento de autoridades.
“Muito embora as multas da ANPD comecem a ser aplicadas em agosto, já vemos um trabalho de supervisão da lei, com a Senacon [Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor] muito atuante nos últimos dois anos.”
Multas a bancos
A Senacon já abriu 12 averiguações envolvendo a Lei de Proteção de Dados desde setembro passado. Apenas no mês de junho, o órgão autuou quatro bancos, podendo crescer esta lista.
No caso, foram aplicadas multas aos bancos Itaú (R$ 9,6 milhões), Pan (R$ 8 milhões), BMG (R$ 5,1 milhões) e Cetelem (R$ 4 milhões).
Elas são decorrentes de um processo baseado em denúncias de abusos ao consumidor na oferta e contratação de empréstimos consignados. Isso inclui abordagens insistentes a vulneráveis, como idosos aposentados.
A investigação da Senacon sinaliza que correspondentes bancários cadastraram consumidores sem informá-los que os dados seriam usados para oferta de crédito. Entretanto, todas as instituições afirmaram que recorrem ou recorrerão da decisão.
Notas
O Itaú disse em nota que compreende “que foram desconsiderados argumentos relevantes, que demonstram a inexistência de qualquer responsabilidade nas práticas relatadas”.
O Pan disse que começou a mobilização do setor para a autorregulação do crédito consignado para queda do número de reclamações. Já o Cetelem afirma que age em conformidade com a legislação.
Por fim, o BMG “reforça a inexistência de qualquer envolvimento com o suposto vazamento de dados de beneficiários do INSS” e diz também que, em relação à oferta de consignado, tem procurado fazer melhorias.
*Foto: Reprodução/Shutterstock